Realizou-se durante três dias – de 30 de Maio a 1 de Junho – o festival Pinkpop em Landraaf, na Iolanda. Os organizadores apregoam-no como o festival mais antigo do mundo a realizar-se todos os anos, sem interrupções. Verdade ou não, este foi – facto – o quadragésimo Pinkpop seguido.
A ideia de ir a um festival num país que não o nosso, onde estamos limitados por diversas condicionantes, principalmente financeiras e de locomoção seria sempre peregrina. Felizmente havia uma Decathlon, quase de propósito, na cidade mais próxima. Ainda assim, tal fortuna não impediu dois viajantes de ter de recorrer a comboio + autocarro + caminhada a pé para chegar a bendita loja. Compreende-se. A Decathlon só pratica preços incrivelmente baixos porque poupa em alguns recursos. Um deles é, pois, a localização. Encontra-se sempre – ou quase – em parques industriais. (Por exemplo, em Portugal há uma loja em Taveiro, na Holanda numa pequena cidade (e nos arredores) e em Itália existe uma fora de Roma e outra fora de Pisa).
Mas voltemos ao festival. Com 40 anos de existência, este é naturalmente um acontecimento enraizado na cultura holandesa. Como tal, vê-se de tudo. Famílias completas apetrechadas de tendas, comida, bebida, e todo o tipo de confortos de que não prescindem, mesmo por 2/3 dias. Até algo bastante engraçado, hippies, punks e todos os estilos imagináveis que deixaram de ser moda há mais de 20 anos. Contrastam de um modo quase cómico com os holandeses jovens. Uns de havaianas, outros de botas pretas (o calor que os homens não passariam…). Cheguei inclusivamente a ver – acreditem ou não – um punk (já sem crista), de bengala.
O evento tem bastante que se lhe diga. A maior inovação – preciosa para nós – foi o facto de “pagarem” cada conjunto de 25 copos recolhidos do chão (no sentido estrito. O sentido lato incluía, a meu ver, o lixo. Acho inteiramente legitima a interpretação). Cada conjunto equivalia a 2 senhas, ou seja, a 5€. Isto porque estes meninos não vendiam nada por menos de 2.5€ (uma senha). Uma refeição “normal” nunca ficaria por menos de 2€ e facilmente chegava aos 3 e, até, aos 4€. Preços normais para cidadão dos países baixos, mas não para estudantes portugueses ou “inter-railers”. Por conseguinte, só se via dois tipos de pessoas a recolher copos. Miúdos e gente com mau aspecto (nós). Ascendeu, portanto, a largas centenas, o número de copos recolhidos, ao longo dos dias, para fazer face às necessidades de vária ordem). 800 em números redondos, calculo. Ou seja, 160€. Poderá parecer muito. Mas com banhos a 2.5€ (sim, isso também, e em más condições), cerveja também, pequeno-almoço a 5€, almoço a 7.5€, etc, não é difícil perceber de onde vêm os 80€ por cabeça. Não fora o esquema e haveria com certeza fome e sede (não sei, confesso, por que ordem!). Ou por outra, sede não haveria – havia água a parte (embora fossem sete cães a um osso). Ou haveria de outro tipo, possivelmente…
O certame incluía vários tipos de petiscos para alimentar o holandês médio (grande, portanto). Curiosamente, ao invés de hambúrgueres, pizas e afins – embora também os houvesse – a oferta concentrava-se noutras origens e era relativamente alargada. Destaque para a comida do “far east”, que oferecia (ao jantar, porque “não há almoços grátis”, já se sabe) arroz e saté. Não faltava, no entanto, o alimento holandês por excelência: croquetes. Não como os nossos, melhores. Crocantes por fora e cremosos por dentro. Talvez façam pior – certo -, mas sabem bem melhor.
A fauna – os holandeses – aproveitou o evento para “pôr o sol em dia”. Era vê-los esparramados na relva, a cozer. Os outros – aqueles que, corajosos, assistiam a concertos – apresentavam o chamado bronze à camionista. A verdade é que, não obstante a temperatura ser amena, o sol é/estava fortíssimo. Pobres holandeses, diria. Pareciam, porém, gostar!
Como bom evento holandês, a música começava cedo: às 15h no primeiro dia. Viagem, tenda, instalação e distância de 40m do parque de campismo ao “Festivalterrein” fizeram com que perdessemos uma das bandas que mais queria ver. Descoberta recente (“a bem dizer”, ao analisar o cartaz), as Noisettes (das quais já aqui pus um vídeo) são uma excelente banda. Com dois CDs algo diferentes, juntam rock, pop, jazz, numa mescla que me abstenho de caracterizar tecnicamente (convoco para essa tarefa o nosso crítico oficial), mas que resulta bastante agradável.
De destacar, também, no primeiro dia, The Killers e Bruce Springsteen. Os primeiros deram um concerto notável a nível técnico. Excelente execução e muito boa voz do vocalista Brandon Flowers. Pena, porém, não ter havido mais interacção com o público. Compreende-se que, num festival, o tempo seja uma condicionante, mas, caramba, desde o tratamento das músicas ao diálogo com o público, os The Killers podiam ter feito mais! Pormenor lateral curioso, o vocalista é mórmon, ao que consta, praticante convicto.
Bruce Springsteen – o velho – não era, confesso, minha prioridade. Como tal, vi o concerto de longe. Mas tenho que tirar o chapéu ao “Boss”. Prolongou bastante o concerto – o último do dia – dando ao público um espectáculo quase intimista que culminou na perfeição o primeiro dia de festival
(Entre outros, tocaram no primeiro dia, também, Just Jack, Elbow e Chris Cornell.)
O segundo dia – aquele, na minha opinião, com o cartaz mais fraco, ostentou The Rifes e Placebo (Depeche Mode, a figura de cartaz, cancelou o concerto dias antes em virtude do internamento do vocalista. Em qualquer caso, não sou particular fã da banda).
Os The Rifles foram mais uma descoberta recente. São uma banda relativamente nova – 2 CDs lançados, um deles este ano. Têm um som que eu considero bastante agradável, muito na onda de outras bandas de indie-brit-rock, Franz Ferdinand, Arctic Monkeys, etc. Contudo – culpa da banda ou da organização – protagonizou uma performance má. O som das guitarras eléctricas teimava em sobrepor-se ao do vocalista, até nas músicas mais calmas (para ser honesto, tal não pareceu incomodar os artistas, pelo que deduzo ter sido propositado). Compreendo o reforço das cordas num concerto, mas há limites. Músicas boas tornaram-se um acumular de ruídos com reminiscências – não mais – das originais. Ademais – à semelhança dos The Killers – foram pouco activos no estímulo ao público. Em qualquer caso, é uma banda a seguir, pelo menos no leitor de mp3.
Os Placebo, por outro lado, protagonizaram um dos melhores concertos do festival. Não sendo particular seguidor, consegui ver o concerto de perto, e não pude deixar de apreciar a performance. Sentida e vívida, deixaram a alma em palco. Um aspecto negativo, contudo, é de destacar: Julgaram, a meu ver, mal o público. Optaram por devotar parte significativa do concerto às músicas do novo album, perante um público que, sendo de festival, era variado e pedia as músicas de sempre.
(No segundo dia tocaram, também, White Lies, James Morrison, Keane e Madness)
O terceiro e último dia foi, quanto a mim, o melhor.
Começou com os The All-American Rejects. Trata-se de mais uma “banda OC”, deste novo estilo punk-pop-rock (à falta de expressão melhor), que junta guitarras eléctricas a letras simpes e uns refrões que ficam no ouvido. Ainda assim, devo admitir que gosto da banda. O suficiente para a ter no meu ipod. Recomendada – pasme-se – pelo nosso paladino da boa música, o António P. Neto.
O grande momento do dia – e, para mim, do festival – foi, sem sombra de dúvida, o concerto dos Franz Ferdinand. Conseguimos, mais uma vez, ficar na zona da frente (inteligentemente – parabens à organização – separada da segunda linha por uma vedação). A performance foi quase perfeita. Tecnicamente bem, destacaram-se sobretudo pelo tratamento dado às músicas, claramente pensado para o palco em questão (ao contrário do que fizeram os The Killers). Souberam cativar o público do princípio ao fim com a interacção possível e sobretudo, com músicas electrizantes, cujo tratamento foi muito para além dos 3/4 minutos de uma faixa comum de CD. Confesso-me, porém, suspeito. Considero os FF uma das melhores bandas do género da actualidade. Nota-se em cada música um cuidado extremo com o pormenor e, a isso, junta-se uma noção de ritmo que muito poucas bandas possuem.
O último concerto a que assistimos (não o último do dia. Esse esteve – pasme-se – a cargo dos Snow Patrol) foi dos The Kooks (curioso, by the way, o modo como estas bandas de indie-rock teimam em chamar-se The ____). Defini-los-ia como um misto entre The All-American Rejects e Franz Ferdinand. As letras dos primeiros, a música dos últimos (menos refinada). Têm , ainda assim, uma boa música. Alegre, como eu gosto. O concerto foi razoável. Sem deslumbrarem, cantaram bem. Infelizmente, talvez por ser num palco diferente, a plateia não funcionou bem, replecta de uma resma de miúdos excitados que teimavam em fazer moche, mesmo nas músicas mais calmas (por exemplo, para quem conhece, na ‘Naive’). O que têm os The Kooks a ver com moche, perguntará o leitor? Desconheço. Valeu o momento pela cara de desconforto intestinal de alguns pais zelosos que haviam seguido os seus filhotes para o concerto da sua banda preferida quando se viram constantemente empurrados sem fuga possível
Ouve ainda um concerto a que gostava de ter assistido, tenho ouvido algumas boas referências aos Mando Diao. Ainda não ouvi nada, mas sinto que talvez tenhamos perdido uma boa oportunidade de os ver ao vivo.
(No último dia, destacam-se, também, The Script, Katy Perry, The Ting Tings – ao mesmo tempo que The Kooks -, Billy Talent, Novastar, Amy Macdonald e Anouk).
Em resumo, O Pinkpop festival, embora caro para o bolso português, vale a pena. Pela música e pela mística.
* Coluna trocada com o MPV, por…motivos óbvios.
Esta descrição promenorizada das peculiaridades do festival está qualquer coisa… só te estou a imaginar lá no meio a observar isto tudo 😀 posto isto, só tenho a acrescentar que bem que gostava de ter visto também o Bruce Springsteen ao vivo! E aqui em Barcelona devo estar com sorte, porque há uma Decatlhon mesmo no centro da cidade, foi lá até que comprei uma mochila para pequenas viagens, veio mesmo a jeito eheh.
Isto são horas?? 😛
Bem…lá se vai a minha teoria sobre as Decathlons, tão bem fundamentada…!
Mas aquilo e brutal. 10€ por 1 saco cama, 35€ por 1 tenda q se monta sozinha…apetece comprar a loja toda.
É um sucesso de loja! Aqui quando vejo uma família toda vestida com aquelas camisolas de lã polar marca Quechua baratinhas que eles lá têm penso logo que são portugueses e, normalmente, confirma-se 😛
Mariana:
Aí em Barcelona, tiveste o Primavera Sound, um dos maiores festivais de todo o Mundo (bem melhor que o Pinkpop Festival – via de bom gosto ainda assim, Placebo, Elbow ou o Boss).
Eis o cartaz dp brutal Primavera Sound (em apenas 2 dias, decorreu de 28 a 20 de Maio):
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Em todo o caso, bom texto Zé. É sempre óptimo haver crónicas de eventos aqui no blog.
Depois do 1º comment, agradeço a tua misericórdia! 😛
Devemos ser o único blog português com uma “review” deste festival, eheh. 40 edições é… obra.
P.S.: guarda a “Iolanda” para as private jokes, pá 😛