Como me pediram para dar um título…

Recentemente, li no “The New York times” uma notícia sobre uma proposta de lei avançada por Barack Obama no sentido de permitir que suspeitos de terrorismo pudessem ficar em “prolonged detention”, o que no nosso sistema equivalerá à prisão preventiva (com algumas reservas, uma vez que há também a figura da detenção, que consiste na situação do suspeito/arguido até ser presente a um juiz). No sistema penal norte americano, dominado por um “rule of law“, dá-se prevalência à protecção dos direitos do arguido/suspeito sobre o interesse do estado e da comunidade em descobrir a verdade. E daí que as hipóteses de prisão preventiva sejam taxativas e se pretendam raras. Tanto assim é, que muitos constitucionalistas americanos estão em crer que a proposta será barrada ou chumbada pelo Supreme Court.

Na mesma notícia, dizia-se que o instrumento da “prolonged detention”, ou da prisão preventiva – entre nós- teria um “slightly totalitarian ring”, ou seja, um tom algo totalitário. A notícia despertou-me a atenção pelo seguinte: é que, em primeiro lugar, não deixa de ser curioso que se perscrute uma tonalidade totalitária numa medida como a prisão preventiva num estado em que até há bem pouco tempo – quiçá ainda – se extorquiam confissões e informações através de meios de tortura e de coacção de vontade. Dick Cheney pode dizer que não é tortura, mas entre nós, estados em que existe esse instrumento totalitário que é a prisão preventiva, parece que é. Em segundo lugar, a prisão de Guantánamo sustentava-se, no fundo, numa ideia de “estado de direito em estado de necessidade”; e Obama, ao mostrar intenção de a encerrar, parece querer repor o estado de necessidade no estado de direito. As reservas manifestadas pela opinião pública no acatamento da proposta de Obama no sentido de uma “prolonged detention” para os terroristas evidenciam que talvez a vertigem securitária do “patriotic act” de Bush esteja já em vias de superação…Mas, enfim, não deixa de ser com grande alívio que percebo que nós, europeus continentais totalitários, há muito que já estaríamos preparados para esta vertigem com a nossa prisão preventiva…

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Uma resposta a Como me pediram para dar um título…

  1. José Maria Pimentel diz:

    O sistema americano é uma mescla curiosa. Tendo na base uma cópia do sistema inglês, teve desenvolvimentos posteriores (compreensíveis, se tivermos em conta que os EUA não são o RU) que trouxeram ao sistema os famosos paradoxos.

    Aí está um deles.

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