
Depois dos conterrâneos Mu e Mandrágora, chegou a vez dos também portuenses Pé na Terra lançarem um óptimo album em 2008. Curiosamente, três albuns bem diferentes: enquanto os Mandrágora levam a tradição até ao jazz e ao rock progressivo e os Mu misturam culturas espalhadas um pouco por todo o Mundo, os Pé na Terra são quem mais próximos estão da música tradicional portuguesa, embora com um cunho muito pessoal.
Falemos já um pouco da sequência mais forte deste registo homónimo de estreia: ao 4º tema do disco surge, com “A Balada do Sino”, a primeira de duas versões de Zeca Afonso (a outra é “Maria Faia” que, apesar de ser um tema tradicional, foi claramente celebrizada pelo Zeca). Depois de um início extremamente lento e bonito, esta versão da “Balada do Sino” ganha nervo sensivelmente a meio, algo que se vai intensificando até ao seu final, terminando da melhor maneira com um excerto de um inflamado discurso do próprio Zeca Afonso de apelo à insurreição (que falta fazem, no mundo globalizado actual, as suas palavras de ordem, o seu sonho e a sua utopia). Essas palavras dão o mote para aquele que é um dos grandes temas que escutei nos últimos tempos: “Sentir”. “Sentir, ser diferente, mudar o som, crescer, explodir, voar, livre sem pensar”. São estas as palavras que percorrem de forma hipnótica todo o tema, acompanhadas por uma lindíssima melodia, onde se destaca esse instrumento para mim tão maravilhoso: a gaita-de-foles. Este tema mostra bem a importância dada pelos Pé na Terra às letras, à palavra, a uma certa estrutura poética que se espalha ao longo de todo o disco. Como tal, não é de estranhar que o album feche precisamente com o poema “Sete”, declamado por dois convidados dos Pé na Terra: Patrícia Miranda e Tiago Meireles (ele próprio autor do poema).
No entanto, nem só de faixas com voz vive este disco. Quase metade do album é instrumental, contendo temas bastante distintos uns dos outros, como se pode verificar escutando, por exemplo, “Valsa Verde”, “Salpicos” e “Passodoble de Vizela”. Esta diversidade só demonstra, em definitivo, que este primeiro longa duração dos Pé na Terra é um trabalho bastante eclético, recheado de ideias diferentes.
Enfim, através deste grande disco, a cidade invicta volta novamente a marcar pontos no panorama musical português de 2008.
P.S. Os Pé na Terra venceram a eliminatória nacional do Eurofolk 2008, que se realizou em Coimbra dia 7 de Julho. Como tal, vão representar Portugal na sua edição internacional, a realizar em Málaga no final do mês de Agosto
desde já refiro que só ouvi as musicas que estão no MYSPACE, mas pela amostra discordo que apresentem qualquer “cunho pessoal” á musica folclórica porque, para mim, não passam de novas “versões” de musica folclórica sem introduzirem nada de novo: podiam bem ser os grupos de folclore que eu ouvia qdo. tinha 15 anos (na terra da minha avó ou nos programas da antiga RTP) e que ainda se mantinham 25 anos depois. A musica popular folclorica não tem em portugal artistas que a tornem PRESENTE pois mantêm toda a construção, roupagem e linguagem que tinha há 20 anos, e se alteram uma destas caracteristicas é para a tornar musica ligeira ou mesmo pimba( excepção seja feita aos Gaiteiros de Lisboa e ao saudosos Sétima Legião).
De referir também, que acho a voz da cantora perfeitamente banal e até com um timbre irritante e que as musicas até começam bem mas depois falta a qualidade para marcar a diferença e ainda mais qualquer tipo de genialidade
Paulo, vamos lá aos motivos da discórdia:
1. Apesar de pegarem na música tradicional, estão bem longe de se manterem demasiado próximos dessa mesma tradição (até porque, se o fizessem, se fossem demasiado puristas, o mais provável era eu não achar grande piada). O nervo ou a existência de instrumentos como a bateria ou o baixo não deixam margem para dúvidas.
2. A voz dela pode ser banal, mas é banalmente envolvente. Uma vocalista não tem de ter uma voz peculiar e muito diferente do habitual para que nos cative. Nem toda a gente pode ser uma Bjork, uma Lisa Gerrard, uma Liz Fraser ou uma Joanna Newsom.. Há vozes vulgares absolutamente extraordinárias.
3. Como resistir às palavras poéticas e à melodia emocional do “Sentir”???
Só concordo contigo numa coisa: os Sétima Legião e os Gaiteiros são, de facto, do melhor que se fez na reconstrução e modernização da música tradicional. Mas há muito mais para além disso. Trata-se, muitas das vezes, de uma questão subjectiva de gosto pessoal admirar ou não outros projectos.
Bolas, Pé na Terra não tem nada a haver com música folclórica……é musica tradicional com uma roupagem folk (aqui e ali rock como o final do tema “A Balada do Sino”) bastante personalizada e interessante.
O timbre da vocalista não será dos melhores do mundo, Amálias não se encontram todos os dias nem Maria Callas, mas é bem melhor que quase todas as cantoras que actualmente interpretam musiquinhas de, e para, as telenovelas da TVI.
E ao vivo, garanto caro Paulo, são bastante profissionais e puxam pelo público como se não houvesse amanhã e este, rende-se e salta e pula e canta com eles. Nem algumas bandas rock que para aí andam têm tanta aderência do público.
Tive a oportunidade de num espaço de mês e meio vê-los 3 vezes, 2 em Coimbra, outra no Andanças e garanto-lhe, caro colega blogueiro, que das 3 vezes que os vi gostei bastante, quer pela simpatia, quer pela alegria que transmitem ao cantar. Uma das vezes que os vi foi na FNAC e as pessoas que lá estavam eram praí 30 (nem sei se chegavam) e eles tocaram uma hora e foi tão intenso como se estivessem no estádio de Alvalade a tocar para 50 mil pessoas. Artistas destes têm o seu valor.
E não, não os conheço nem sou amigo deles para estar a fazer publicidade grátis. Eles são do Porto, eu sou de Coimbra. Apenas merecem. 🙂
Obrigado a todos por este dialogo sobre a banda. A todos (especialmente ao Paulo) convido para virem ver um concertozinho que vos convier!
Pode ser que aqui o nosso amigo Paulo mude de opinião (ou não)! hehehe =)
Abraço a todos e mais uma vez muito obrigado por este espaço!
Não precisas de convidar, Tiago, vou com todo o prazer e de livre e espontânea vontade. Há muito tempo que não assistia a um concerto como o que deram no “Andanças”, em que era tão evidente um espírito de comunhão entre a banda e o público!
Conheço pouco do vosso trabalho, mas a minha opinião inclina-se mais para a do Matusalem. Se bem que me parece pouco importante que se preocupem com a catalogação: acho que devem tocar o que vos der prazer, a vocês e aos que acompanham o trabalho da banda. Como toco em 2 grupos de música tradicional, sinto que estas barreiras de género são bastante castradoras. Tecnicamente, apesar de não ser ninguém para o avaliar, penso que é claro que estão no bom caminho. Nisto tenho de discordar em absoluto do Paulo Jorge Pereira, já que os grupos de que fala nem sequer têm, geralmente, o cuidado de afinar os instrumentos. E isto é a ponta do iceberg.
Só um reparo: adesão, Matusalem, não “aderência”!
Tens razão, António! Estava a ser um pouco egocêntrico porque a primeira vez que os vi ao vivo colei no som deles! E acredito que muitos mais terão igualmente colado por esse país fora, depois de os ver ao vivo, eheheheheeh. Se Málaga fosse aqui ao lado lá estaria eu para fazer claque! E acredito que eles têm pernas para andar e seguir caminho rumo ao estrangeiro para espectáculos, tal como os Dazkarieh. Qualidade musical não lhes falta!