O Tratado de Lisboa e o Espírito Anti-Democrático Europeu

 

Começo este Post por admitir que pouco ou nada sei sobre o Tratado de Lisboa (e a propósito disso concordo em absoluto com o que disse o Bandeirinha: muita da nossa ignorância se deve à falta de vontade dos governantes em informar os cidadãos, que preferem mandar chavões pró-europeus para o ar do que dizer uma ideia ou um propósito que torne este Tratado assim tão importante, o que só dá motivos para desconfiar).

Mas a questão não é essa.  A questão é haver um respeito mínimo pelas regras democráticas básicas, algo que a Europa se prepara mais uma vez para não cumprir.

 Tenho muitas dúvidas se este tratado, pela sua complexidade, deveria ou não ser sujeito a um referendo popular. Mas já não é isso que está em causa. A partir do momento em que se avançou para o referendo em França e na Holanda e ele foi chumbado, a única solução para alterar essa decisão seria efectuar um novo referendo que modificasse essa decisão (e não optar por, de forma anti-democrática, mudar o nome de Constituição Europeia para Tratado de Lisboa e aprovar tudo à mesma, aldrabando-nos de forma descarada). É a mesma situação que se passou com o aborto até às 12 semanas em Portugal. Manifestei-me a favor da lei e julgava, à partida, não ser necessário um referendo para a legitimar, bastando a decisão parlamentar. No entanto, a partir do momento em que houve um referendo, é uma questão de respeito para com os cidadãos a realização, para eventual alteração dessa medida, de uma nova consulta popular, o que veio a suceder no ano passado.

Mas voltando ao tratado, tudo corria bem à Europa. Arranjaram um meio processual perfeito para engendrar o seu plano: mudaram de nome e, para que não se repetisse a desfeita, para que o povo não tivesse novamente o “descaramento” de discordar com os líderes eleitos (quando se faz um referendo há, na minha noção de democracia, duas respostas possíveis: Sim e Não; mas parece que esta gente não concorda comigo, acha que só o Sim seria válido), votava-se tudo por via parlamentar. Acontece que, por puro azar, havia um país que pela sua constituição teria de realizar o referendo: a Irlanda (qual aldeia gaulesa de Asterix no meio do domínio romano). E pior, estas pessoas tiveram novamente o “descaramento” de dizer NÃO ao tratado.

Novo impasse, nova situação que, se os líderes europeus tivessem espírito democrático a sério e um pingo de vergonha, levaria ao enterro por muitos e bons anos da constituição europeia ou das designações análogas com o mesmo objectivo. Mas parece que não, aguardam-se mais manobras processuais vergonhosas. Talvez o desprezo puro e simples pela opinião dos irlandeses, talvez mais uma mudança de nome do tratado ou até, quem sabe, de uma forma mais extrema, o puro saneamento da Irlanda da União Europeu, em nome do tão propagandeado “espírito europeu”

 

P.S.: Para culminar isto tudo, ainda depois temos de ouvir argumentos do tipo do Luís Delgado que, de forma intelectualmente desonesta e condenável, referiu que o tratado tem de avançar, que a opinião de 400 000 pessoas não se pode arrogantemente sobrepôr à de 400 milhões. É preciso ter lata. É certo que o país está cada vez mais alienado e amorfo, mas ainda tem um bocadinho de testa para não engolir estes argumentos falaciosos. Quem quis impôr alguma coisa à força foram meia dúzia de políticos europeus, que quiseram e continuam a querer ignorar a opinião de milhares ou milhões de franceses e holandeses e agora mais uns milhares de irlandeses.

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Uma resposta a O Tratado de Lisboa e o Espírito Anti-Democrático Europeu

  1. Basicamente, as ideias são as mesmas. Eu ainda dou o benefício da dúvida que pode não ser um caso de ir a referendo. Agora, “quando vai, sujeitem-se ao que der”…
    Pelos vistos querem impor “a martelo” o tratado; se der mau resultado…

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